quinta-feira, 17 de março de 2011

Falta de infraestrutura cicloviária e educação no trânsito desestimulam população


            Consideradas o meio de transporte mais barato e ecológico e efetivamente sustentável, segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), as bicicletas perdem espaço nas ruas das cidades brasileiras para os carros, ônibus, motocicletas, trens e metrôs. Apenas 7% dos brasileiros usam a bicicleta como meio de transporte, segundo o resultado da última pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A região do país que mais depende das “magrelas” é o Norte (17,9%), seguida pelo Nordeste (11,3%). Por último aparece a região Sul (2%).

            São inúmeros os motivos que fazem a população preterir as bicicletas, conforme a publicação Cidades para as Bicicletas, Cidades de Futuro, divulgada pela Comissão Européia, em 2000. Entre eles estão a falta de uma infraestrutura cicloviária*, de uma integração aos demais meios de transporte, e muito mais, de uma política efetiva de inclusão da bicicleta nos deslocamentos urbanos e do conceito de mobilidade urbana sustentável.

            De acordo com o levantamento realizado pela Secretaria de Nacional de Mobilidade Urbana (Semob), em 2007, há 2,5 mil km de infraestrutura cicloviária implantada no Brasil. Porém, quando se restringe a ciclovias, que são vias de seguranças exclusivas para os ciclistas, esse número diminui para ¼ do total. Dados da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) indicam que há uma frota de 50 milhões de bicicletas no país para 600 quilômetros de ciclovias.

            Para o coordenador do Programa de Pós-graduação em Transportes na Unb, Pastor Willy Gonzáles, o baixo índice de adeptos a bicicleta se reflete na estrutura oferecida aos ciclistas. “Falta respeito aos ciclistas. A população desanima quando vê que não há vontade política e investimentos no setor de transporte, e prefere comprar o seu carro ou moto. A motocicleta e o automóvel estão substituindo a bicicleta. Essa é uma preocupação muito grave, até na área rural esse fenômeno ocorre”, explica. No Nordeste, 47,3% das pessoas, entrevistadas pelo Ipea, afirmam que não há respeito na condição de pedestre e ciclista, seguida da região Centro Oeste com 39,4%.

Incentivo

            Segundo o coordenador do Programa Brasileiro de Mobilidade por Bicicleta – Bicicleta Brasil, Claudio Oliveira da Silva, para incentivar o uso de bicicletas é necessário integrar o programa em um conceito de mobilidade urbana e novo modelo de cidades. “Devem ser implantadas redes com um misto de ciclovias, ciclofaixas, vias cicláveis e passeios compartilhados. É necessário ter integração com os demais modos de transporte. É fundamental o envolvimento de todos os setores para consolidação de um pacto para dar ao país o status de ‘amigo dos ciclistas’”, afirma.

            Um pacto ainda longe de acontecer. Todos os anos, cerca de 584 mil pedestres e ciclistas morrem no trânsito, informa a Organização Mundial de Saúde (OMS). Ciclista desde 2002, o jornalista Alan Schvarsberg já perdeu um amigo atropelado por um motorista alcoolizado. Ele mesmo se diz refém dos motoristas. “Os maiores desafios não são as distâncias e nem as subidas, são os problemas de segurança ocasionados pelo inchaço do trânsito, pela falta de conhecimento das regras de trânsito - já que muitos não sabem que a preferência é do veículo menor e que se deve sempre manter o mínimo de 1,5 m de distância da bicicleta. A falta de vias exclusivas e/ou sinalizadas para o uso da bicicleta, como ciclovias e ciclofaixas. Isso faz com que nós, usuários de bicicleta, coloquemos em risco nossa vida todos os dias, ao ter que praticamente disputar o espaço das vias com os automóveis”, desabafa.

Modelo

            Conforme o Semob, as três maiores infraestruturas cicloviárias estão instaladas no Rio de Janeiro (RJ), com 140 km de extensão; seguida de Curitiba (PR), com 120 km e Colombo (PR), 95 km. Apesar da cidade do Rio de Janeiro aparecer com a maior extensão de infraestrutura cicloviária, segundo o fundador da Associação Blumenauense pró-Ciclovias (ABC), Eldon Jung, esse número - quando feita a relação população e quilômetros de ciclovias -  são transformados em 10 cm por habitante. Número inferior a Blumenau, que conta com 50 km de ciclovias, 16 cm por habitante.

            Há 14 anos à frente da Associação, Jung disse que para mudar a realidade das ruas da cidade de Blumenau foi fundamental a participação popular. “Tínhamos um projeto engavetado há oito anos, com 150 Km de ciclovias. Porém, os prefeitos não tomavam iniciativa. Até que os ativistas pressionaram, e o prefeito da época desengavetou o projeto e construiu os primeiros 35 km de segmentos de ciclovias (não interligadas). Depois, o atual governo construiu mais 15 km e corredores de ônibus estão sendo implantados, junto com as ciclovias. O atual prefeito reconheceu que novas faixas, viadutos são medidas paliativas. E isso só aconteceu pela mobilização social. É bom que outras comunidades se dêem conta disso”.

Projetos e outras proposições

            No Congresso Nacional tramitam alguns projetos de lei para incentivar o uso das bicicletas, porém muitos esperam a iniciativa do próprio autor para desarquivá-los. Nessa nova legislatura, o parlamentar tem até 180 dias para dar continuidade ao processo. É o caso do PL 7909/10, do deputado federal Moreira Mendes (PPS-RO), que inclui a obrigatoriedade da instalação de bicicletários junto aos logradouros públicos ou do ex-deputado e agora senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), autor do PL 6824/2010, que estabelece procedimentos para o transporte de bicicletas nos ônibus utilizados nos serviços de transporte interestadual e internacional de passageiros.

            Tramitando na Câmara dos Deputados, e à espera do retorno das Comissões Permanentes, aparece a proposta do senador Antonio Carlos Valadares (PSB-PE), PL 3228/08, que determina a priorização dos meios de transporte de propulsão humana sobre os motorizados e, sobretudo, do transporte coletivo sobre o individual. Junto com essa proposta está a do deputado Antonio Bulhões (PMDB-SP), PL 1160/2007, que sugere a criação de faixas de trânsito ao pedestre e a implantação de ciclovias, ciclofaixas e faixas exclusivas de trânsito para motocicletas. Os projetos aguardam a designação do relator na Comissão de Finanças e Tributação (CFT).

Infraestrura cicloviária

Ciclovia -Faixa onde o ciclista possa circular com segurança em vias com tráfego pesado de carros
Ciclofaixa - Faixa onde o ciclista possa circular com segurança em vias com tráfego moderado de carros
Cicláveis - Não há separação de fluxos, porém em vias com tráfego leve de carros
Passeios compartilhados - Sinalização para o ciclista circular sobre a calçada
Fonte: Agência1

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